sábado, 24 de março de 2012

A minha versão do amor

  Talvez tenhamos nos amado embora eu ache muito mais provável que não. Tínhamos uma atração pelos erros um do outro, pela melancolia, pela dor, mas acho que não se pode chamar isso de amor.
  Você entendia o final dos meus filmes e eu até que gostava de ouvir aquelas musicas cheias de experimentalismos e conceitos; com você e esse tipo de coisa nos unia: se sentir estranhos ao mundo, não encaixados no lugar mas acho que isso ainda não era amor.
  Nossos santos nunca bateram, eu odeio cigarro e você adora fumar e faz pose, vejo que se sente como alguma atriz do cinema preto e branco. Eu prefiro Caetano e você ama o Chico.


  Você ficava limpando aquelas lágrimas de quando eu bocejava e me sorria e me desarmava de tudo porque no fundo você sabia que eu era avesso a grandes escândalos amorosos e dobrava os joelhos em coisas simples e pequenos gestos e isso era maldade por que aí você abusava demais e sorria e sorria.
  Seus lábios ora hesitantes ora afoitos me tragavam, me sugavam, e no sexo nos completávamos, eu gozava interminavelmente sentindo seu prazer e você gostava daquilo, eu ficava satisfeito em te ver satisfeita por ter me satisfazido mas ainda acho que não chegou a ser amor.


  Quando você decidiu ir embora eu toquei seu braço e depois toquei meu barco em frente, ele foi flutuando em águas turbulentas, acho que eu não quis mais ver nenhum filme nonsense de algum diretor super-estimado e nem expliquei nenhuma letra de música a ninguém, essas coisas tinham mais graça com você.


  Nós dois sempre fomos um casal de revista em quadrinhos,reviravoltas surpreendentes, terceiras pessoas atrapalhando e pudemos dizer que tivemos nossos vilões e que nos amamos e contamos histórias aos amigos falando do quanto foi divertido mas nós dois sabemos que não era amor, talvez uma forte ligação de amizade e sexo. Como eu amava estar entre suas pernas e na sala tocava "sexual healing", e você fechava os olhos "
"And when I get that feeling I want Sexual Healing".
  Acho que fui malhar, fui conhecer uma porção de vagabundas por aí, tudo que antes eu não gostava e você continuou lendo e se intelectualizando enquanto eu prostituí minha escrita e vendia poemas escrotos para sites obscuros a preço de banana. Não me sinto culpado, cada qual vai num caminhozinho besta que escolhe ou como você preferia dizer "um caminho guiado por uma força maior" .
  Mas o pior de tudo é que eu sinto falta desse "não amor", das tardes de domingo transando em frente ao programa do Faustão ou no cinema te irritando com alguma explicação absurda para um filme em que só nós vemos significado aparente.

  Sabotei minha própria esperança de ser feliz para sempre quando deixei de buscar essas coisinhas minúsculas que fazem a gente mais alegre como ver um curta metragem feito de massinha de modelar e achar aquilo o máximo, ando numa maré complicada, mar profundo, explicações pra tudo e todos e muita discussão intelectual inútil e me dá saudade de você as vezes, não por ter sido amor mas por ter sido leve e ter pouco doído, isso em mim foi raro na vida, homem que parece um nervo exposto.


  Mas hoje quem eu sou eu pra te querer, se te trouxesse aqui e admitisse alguma sombra de sentimento seria o fim, porque fomos felizes em não dizer nada e nem prometer.
Acho ainda que você parece garota de filme e eu fico na minha vida inventada, vivendo o que chamo de amor mas bem longe da satisfação que um dia eu tive com nosso não amor.
  Agora quem vem se entregar aos meus cuidados e se lambuzar de um prato cheio de luxúria, beijos e risos na tarde? Ah, eu perdi muito tempo com coisas inúteis e sempre soube disso, útil era ficar sentindo você ofegante com o corpo suado sobre o meu, não que aquilo fosse amor mas era bom e ao contrário de muitas mulheres ter você não era má sorte.
  Num mundo ideal você seria pra sempre minha dividindo a felicidade de jamais ser de canto nenhum mas todo esse nonsense é só mais uma das minhas versões do amor que eu vou gravando na carne.


 



PENSAMENTO CONSEQUENTEO céu está abrindo aos poucos. E eu preferiria que continuasse da cor que você mais gosta.A falta de intimidade, vivo até hoje uma dor que ninguém autoriza. Vivo nela o estranhamento.
Pois quem não estava lá não tem o direito de invadir uma dor familiar.(Ana. C)

sábado, 3 de março de 2012

FRAGMENTOS AMOROSOS (Not a matter of choice Just a matter of time)

  Os dois estavam dispostos a andar sem direção e sem saber o que procurar, assim pareciam viver felizes. Um dia se encontraram, conversaram, tomaram vinho e viram que tinham muito em comum: o gosto pela liberdade de não atar o coração. E no início da manhã cada um seguiu seu caminho e nunca mais se viram.

  Acho que ela tinha uma mania irrefreável de maltratar o próprio coração. Tudo que era mal ela permitia que lhe fizessem. E se tudo parecia bem ela se coçava, se desesperava, a tristeza se tornou um vício e com o tempo o que ela sentia virou uma incógnita até em seu interior, passou a gastar muito com alegria guardada em pequenos comprimidos. Dizem que não havia rapaz capaz de fazer aquela moça feliz. Eu a observava, eu também acho que felicidade é uma fruta doce que logo apodrece;  mas ao menos eu fingia.
  De toda essa tristeza nascia alguns belos poemas, mas o que é o poema se não se pode parar de engrandecer a tristeza em palavras e viver a alegria na prática? Mudei de cidade e não mais a vi. Sinto falta de seus olhos tristes e seus lábios falando mal do amor, em alguns dias eu quase concordo...quase.

  A última lembrança que tenho dela são aqueles olhões castanhos parecendo mais claros com o sol da tarde iluminando-os. Ela disse em algumas poucas palavras que não iria mais ficar, tentei um discurso amoroso longo que se mostrou inútil. Eu deveria ter me comportado como homem e dado as costas, ter ido embora e comido uma boa puta, mas não eu lacrimejei, pedi pra ela ficar e passei bem uns dias derrotado.
  Diabos! As boas reações de força só me surgem quando já fraquejei, e muito tempo depois.



  Eu bebo o vinho e dou risada, mancho meu livro e minha camiseta. Choro e faço drama, fico sozinho em casa. Quem pode me negar esse direito? Direito de não me esbaldar por aí, de não fazer social, direito de exorcizar com sal cada demônio nessa chaga exposta?  
  Eu lia os jornais e chorava com as dores do mundo e agora me distancio, não dá mais pra sofrer por uma causa perdida, crianças mortas, lares desfeitos, bêbados, vagabundos, nem mesmo choro por mim ou minha mãe.
  Que se dane as dores do mundo, meu corpo mal está aguentando esse porre.

  Eu agradeço, de vez em quando agradeço ao deus que muitas vezes nem acredito.Mas as vezes eu sinto uma mão pesada no meu ombro e sinto que vem muita coisa por aí. Sou obrigado a acreditar, sozinho eu não vou nem na esquina , quanto mais nesse inferno que prevejo.


  No dia do maior adeus, eu caminhei por aí, sem meu senso de humor  de sempre. Desde desse dia toda piada ficou amarga. Não devia acreditar que um dia ela pudesse ter gostado de mim, mas levava provas no pensamento.          Como não ficamos juntos para sempre se mil vezes em fantasia fomos para Disneylandia, e casamos tivemos filhos, envelhecemos juntos? Que armadilha imaginar demais. Hoje eu nem lembro dos tempos doces de romantizar qualquer olhar, vejo na mulher uma graça, uma admiração imensa, mas estou longe de amar aliás é uma palavra que se esvaziou de sentido nesses loucos tempos de razão.

  
Eu sabia as respostas para muitas coisas, até mesmo dei as receitas exatas de felicidade para muitos amigos e de tanto me convencer que sabia fui colocar em prática e a certeza se perdeu. A vida esmaga quem quer viver só de de certezas, ando vivendo de perguntas esperando que sejam as perguntas corretas.
Elas eram felizes e tinham uma a outra, se era amor, amizade, coisa sem nome, isso não cabia explicar ao mundo. O que se sabe é que se completavam e o tempo maior, deus de tudo e todos abençoa os que vão em nível intenso viver de amizade, viver de amor, de riso. É válida toda tarde em que se pode brincar entre folhas secas e se sentir pleno. Digo, é raro...tentem brincar entre folhas secas com seu melhor amigo.





PENSAMENTO CONSEQUENTE:  Uma vez que você foi para o inferno e voltou, é o bastante.É a mais silenciosa celebração conhecida.   CHARLES BUKOWSKI










TODAS AS IMAGENS ACIMA SÃO DE AUTORIA DE  GABRIELE DIOLA